domingo, 16 de julho de 2017

COLUNA DO LÁZARO ALBUQUERQUE: CRÔNICA DO DOMINGO

CHICO BENEVIDES, O PREFEITO ELEGANTE
Lázaro Albuquerque Matos

Não sou Tiririca e nem Duque Bacelar é a Florentina, mas a impressão que deixo é que somos quase isso. Duque Bacelar de Jesus: amo-a e ela me seduz. Hoje eu disse: não vou escrever nada sobre minha cidade. Já chega. Duque de Jesus: estou nela e ela me conduz. Florentinamente, Duque Bacelar conduz-me, hoje, a Francisco Benevides de Carvalho.
Francisco Benevides de Carvalho era o popular Chico Benevides, da alegria de Duque Bacelar. Ele era gerente comercial dos negócios do Sr. Orsini Lisboa. Era morador da vila Garapa de Fora, ao lado da casa do patrão, onde hoje é uma usina de pilar arroz. Bom de coração, compadres e afilhados não lhe faltavam para o selo de amizade. Benevides era amigo de todos. A amizade dele com meu pai foi selada na pia batismal da Igreja de São José. Ele era padrinho de um irmão meu.
Cheio de bom humor, Benevides não perdoava um deslize sequer dos amigos e dos compadres para uma boa gozação. Ele fazia uma boa gozação de tudo. Da língua ferina dele não escapava ninguém. Todos eram tesourados por ele. Nas rodas de conversa com os amigos, ninguém queria sair primeiro, deixando o Benevides com os outros. Era tesourada certa, mesmo que fosse um dos mais íntimos compadres e amigos. Quando queria dar uma tesourada em alguém, Benevides chamava-o pelo nome, com uma exclamação interrogativa, testando a presença da pessoa por perto: “Compadre José Chagas!?... Compadre João Vilar!?... Compadre Brito!?...Ei, Ditador, como vai tu”!?
Benevides deixa o comércio do Sr. Orsini e abre o próprio, onde hoje é casa do Carlos Romão. Na loja do Sr. Orsini, Benevides deixa um amigo muito próximo, chamado Gonzaga, mas conhecido como Gonzalez. Na época, leite ninho era raro e caro em Duque Bacelar. O esperto comerciante Benevides só colocava uma lata do produto em exposição na prateleira, o resto ficava escondido. Era uma desculpa justificada para se livrar dos fregueses do fiado. 
Um dia chega o amigo Gonzalez para comprar fiado uma lata de leite no comércio de Benevides. No que ele fala fiado o “NINHO”, o amigo Benevides se sai bem com a tática da lata única: 
– Oh, amigo Gonzalez, perdoa-me, mas só tem aquela latinha ali. É pra Goretinha. Minha filha está tão magrinha! A Luzia (esposa de Benevides) está chegando para levar. Mas vou a Teresina fazer compras nesses dias, e vou trazer um bom estoque do leite. Aí o amigo pode dispor de uma, ou de mais latas. 
– Tem nada não, Benevides. Vou ali no Eurico para ver se ele me consegue uma lata.
Gonzalez se mudou para Miguel Alves esperando o estoque de leite do amigo Benevides.
Quando menos esperava, Benevides tem nas mãos uns bons meses de administração de Duque Bacelar, como interventor federal. Criou-se um vácuo de poder entre o fim do mandato do prefeito anterior, Constantino Aguiar e a eleição e posse do Sr. Pedro Oliveira, como prefeito seguinte. Coisa da ditadura militar. E foi assim em todo o Brasil. O interventor era para ser Pedro Oliveira. Ele ainda chegou a ser nomeado, mas não assumiu. Se o fizesse não poderia ser candidato na próxima eleição, que já estava perto. Como Benevides era do seio da família Oliveira, principalmente de Pedro, ele ganhou seus dias de glória como prefeito-interventor de Duque Bacelar. E tome elegância do prefeito!
Na nova função, Benevides empanava-se todo para inspecionar obras em sua gestão. Isso mesmo, inspecionar obras! Prefeito nenhum de Duque Bacelar se deu ao luxo de andar tão alinhado como o Benevides. Cedinho da manhã, ele aparecia na Av. Cel. Rosalino, com uma bonita gravata no pescoço, sobre uma camisa de cambraia de linho azul-claro, bem passada, a ferro de brasa, metida em uma calça de tropical azul-marinho, também bem passada, com um par de “Vulcabras” brilhando nos pés. Assim, Benevides comandava uma turma de três homens, de enxada nas mãos, abrindo valas nas poças de lama que tomavam conta da avenida. Benevides subia e descia com os homens, esvaziando a lama das poças da avenida para cobri-las com piçarra. 
Na época, a Av. Cel. Rosalino não era calçada ainda. A lama empoçada tomava conta do logradouro mais importante da cidade. Andar na avenida, só era possível pulando “cancão” sobre as poças de lama. Dizem que o prefeito Benevides, em seu dia a dia de trabalho na avenida, foi fazer isso: pular “cancão” sobre uma poça para proteger da lama o brilhoso par de sapatos, mas as pernas do prefeito não alcançaram o outro lado da poça, e ele estatelou-se na lama, com toda sua elegância de prefeito. Isso foi prato cheio para os amigos e compadre se vigarem das tesouradas de Benevides sobre eles.
E tome gozações encima do Chico Benevides como o prefeito elegante, todo lambuzado de lama.

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