MEIA LÁGRIMA (Conceição Evaristo)
Não,
a
água não me escorre
entre
os dedos,
tenho
as mãos em concha
e
no côncavo de minhas palmas
meia
gota me basta.
Das
lágrimas em meus olhos secos,
basta
o meio tom do soluço
para
dizer o pranto inteiro.
Sei
ainda ver com um só olho,
enquanto
o outro,
o
cisco cerceia
e
da visão que me resta
vazo
o invisível
e
vejo as inesquecíveis sombras
dos
que já se foram.
Da
língua cortada,
digo
tudo,
amasso
o silencio
e
no farfalhar do meio som
solto
o grito do grito do grito
e
encontro a fala anterior,
aquela
que emudecida,
conservou
a voz e os sentidos
nos
labirintos da lembrança.
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