CRÔNICA DO DOMINGO
DONA VITORINA E OLHA O BOLO, FRESCO!
Lázaro Albuquerque Matos
DONA VITORINA E OLHA O BOLO, FRESCO!
Lázaro Albuquerque Matos
Quem chega a Duque Bacelar nos dias de hoje vê um cenário novo e
outro antigo na cidade. De cabeça inclinada, com olhos corridos pra baixo,
flertando o chão, observa-se o cenário novo: o asfalto sob os pés, fazendo o
piso preto e confortável da cidade. De cabeça levantada, com olhos corridos
para o alto, flertando o horizonte, observa-se o cenário antigo: os morros
periféricos, fazendo o contorno verde e montanhoso da cidade.
Tomando um banho no Rio Parnaíba, em águas correntes do presente, vê-se uma
enxurrada de mudança: a cidade cresceu em sua feição urbana, com praças
bonitas, ruas pavimentadas de asfalto e, nelas, casas novas e modernas. O
comércio se expandiu, com grandes lojas. O trânsito congestionou-se, com carros
novos e motoscirculando. Imergindo-se no Rio Parnaíba, em águas correntes do
passado, a lembrança de Duque Bacelar nos afoga em saudade: a cidade era
pequena, com ruas de terra solta e casas de palha e taipa. Mas a amizade
reinava entre os habitantes, com um clima saudável, sem brigas políticas; só
amigos se abraçando e saudando-se uns aos outros.
E era nesse ambiente agradável, na beira do Parnaíba, que Vitorina Gomes, uma
senhora moradora de Duque Bacelar, tinha sua casinha com um forno de barro no
quintal, aquecido a lenha, para assar os bolinhos que vendia, à tardinha, nas
ruas de nossa cidade.
Conhecida como Dona Vitorina do Bolo, ela era mãe de Rosa Ribeiro. E já tinha a
idade bem avançada quando saía às ruas vendendo bolo. Por isso, sempre andava
em companhia de um neto para ajudá-la no transporte do bolo. O Toinho Ribeiro
era o neto preferido para a missão de ajudante da avó, no comércio de bolo
pelas ruas de Duque Bacelar.
Com o sol quebrado, e a tarde beirando o seu diminutivo para a chegada da
noite, lá vem Vitorina, de jacá de bolo à venda no ombro, dizendo na oferta aos
fregueses: “Olha o bolo, fresco”! Inteligentemente, ela fazia o vocativo
pausado, insinuando que o fresco era ele e não o bolo.
Brincalhona toda, Dona Vitorina atraía uma grande freguesia para seu bolo.
Saindo da casa onde morava, na Beira-Rio, onde hoje é a prainha, a boleira
subia e descia ruas com seu jacá de bolo. Fregueses para o bolo não lhe
faltavam. Na porta dos que já eram certos, não precisava oferecer o bolo ao
comprador, chamando-o de fresco; a venda ali era garantida.
O grito de “olha bolo, fresco” só acontecia no espaço de uma casa pra outra.
Vitorina dizia que isso era só para chamar atenção de quem ainda não conhecia
seu bolo. Mas era pura brincadeira: em Duque Bacelar, todos conheciam o bolo e
dele não gostavam. Era um bolinho de rodinha, amarelinho, que na palma da mão
se escondia.
A meninada fazia festa nas portas de casa, à espera do bolo vitorinista. O
período entre às quatro e cinco horas da tarde, em Duque Bacelar, ficou
conhecido como a hora do bolo da Vitorina.
Quem viveu isso jamais esquece a hora do bolo de Dona Vitorina, ouvindo dela,
com muita simpatia: “OLHA O BOLO, FRESCO”!
Nenhum comentário:
Postar um comentário