A BOCA DA NOITE
Carlos Machado
Saio na boca da noite
Para apanhar o dia
E na escuridão da vida desvirtuada
Não encontro caminho vicejante
Viajante na estrada da esperança
Carrego, somente, cicatrizes das
amarguras
Não enxergo estrelas, nem lua
Nada para adoçar meu amar
Nem o doce de teu olhar
O coração com as cordas apodrecidas
Sofre, desgastado pelos ventos do azar
Mas, aos poucos e sem pressa alguma
Surge uma luz tênue no céu
Encoberta pelo negrume da dor
Que arranca suspiros de pavor
Carregando na mente demente
A cantiga da morte solene
O grito estridente do rasga-mortalha
Causa arrepio na pele surrada
Arrancando o sinal da cruz
Na escuridão sem luz
Finalmente, os raios reluzentes do sol
Aparecem de forma incisiva
Como a oferecer guarida
Ao moribundo taciturno
Sem coturno, desnudo
Que nas trincheiras da noite de breu
Sofre, e renasce
Ao salivar do vento matinal
Refrescando como cântico angelical
Um coração combalido de dor
A noite amiga dos desvalidos
Dos enganados e traídos
Dos tristes e iludidos
Traz o dia, todo dia
Para mostrar as feridas abertas
E escancarar a desilusão
De quem pensa ser feliz
Mas, que ao ver a alma no espelho de
luz
Expondo suas desventuras
Prefere esconder-se na noite
Lugar dos desiludidos e abatidos
Na luta insana do amor ferido
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