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sexta-feira, 12 de março de 2021

O PODER DO “S” NA CÂMARA MUNICIPAL

A verborragia na política da Microrregião de Coelho Neto sempre foi criativa, desde a colonização, até hoje. São causos linguísticos dos mais simples aos mais sofisticados que envolvem figuras folclóricas da sociedade. Esse terá o nome da cidade e dos personagens envolvidos subtraídos. Embora com nomes fictícios, o acontecido foi verdadeiro.

1º de janeiro, dia da posse do novo prefeito e da nova câmara de vereadores de Nascedouro, assim chamaremos a pequena cidade. No legislativo, alguns novos e outros reeleitos. Nessas ocasiões, de quatro em quatro anos, o vereador com mais idade, entre os pares presentes, responde pela presidência para dar posse ao prefeito, vice-prefeito e colegas edis.

Pois bem, Antonino Lucena assumiu a direção dos trabalhos com voz pastosa e o “ar” de autoridade nacional, quase um senador da república de tão empolgado que estava diante da plateia que se aglomerava no prédio da pequena câmara municipal, onde o calor era insuportável e os presentes suando às bicas, às 10 horas da manhã.

Meticuloso, exigente, daquele tipo “de tudo nos mínimos detalhes”, Antonino Lucena era a cara da ordem e progresso. Quem o conhecia sabia com certeza que o discurso seria longo e a posse dos eleitos demorada. Os agradecimentos aos presentes e a saudação aos mortos durou quase meia hora.

No recinto, já com o nó da gravata desfeito, suando por todos os poros e, bastante, impaciente se encontrava o vereador para 1º mandato, Zequinha Quente. Zequinha sentava, levantava, respirava fundo, passava a mão na cabeça- sem muitos cabelos, fazia menção de sair do local e desesperava-se com a tranquilidade na oratória do condutor da sessão.

-No passo de jabuti que o Antonino tá falando, só vamos sair daqui lá pra uma da tarde, disse ao colega da direita. – Aqui vai dar merda, concluiu espalmando as mãos.

Com a impaciência já no limite, o edil decidiu tomar “uma” e retirou-se do plenário. Nessas ocasiões vendedores ambulantes disputavam palmo a palmo os consumidores, vendendo principalmente produtos gelados que ajudavam a amenizar o calor. De forma que, Zequinha Quente, saiu diversas vezes do local da cerimônia para refrescar a garganta com uma antártica gelada.

De tanto sair e entrar, entrar e sair, Zequinha foi advertido pelo presidente, que interrompeu o discurso para dizer: “queremos avisar aos presentes e, principalmente, às autoridades que é proibida a ausência no local dos trabalhos”. A advertência foi indireta, pois o nome do fujão não fora mencionado, entretanto os presentes entenderam, incluindo o próprio, para quem era o “carão”.

Após risos- meia boca, de alguns convidados, Zequinha Quente perdeu, de vez, a paciência e a compostura que a ocasião exigia e disse em tom baixo, porém ouvido pela presidência e obsequiados: - “Antonino, tú tá esticando a sessão mais que “priquito” de vaca”.

Antonino Lucena, homem de moral, conhecido por respeitar e ser respeitado, pouco afeito a brincadeiras e dono de um vocabulário sem palavras chulas, não se conteve. Ficou de pé, branco como quem viu a morte, deu uma palmada na mesa, que estalou no auditório, e disse com voz impávida e locução rápida: “senhores, vereadores Zequinhas, os senhores podereis, seres cassados, agoras”.

Carlos Machado

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