Há no
enredo construído a partir do depoimento de Marcelo Odebrecht à Justiça
Eleitoral todo tipo de personagem —há um explorado, uma injuriada e um
inocente. Só não há um vilão. O herdeiro da Odebrecht considera-se um “otário
do governo”, um “bobo da corte” —um sujeito obrigado a tocar obras indesejadas
e a pagar propinas a políticos.
Dilma
Rousseff se apresenta como vítima das “mentiras” do empreiteiro sobre o caixa
dois de sua campanha. E Michel Temer reafirma sua inocência porque o delator
disse que jantou com ele, combinou um socorro monetário ao PMDB, mas afirmou
que quem tratou do valor e da forma de pagamento foi o fiel escudeiro Eliseu
Padilha, não o presidente.
Poucas
vezes na sua história o Brasil atravessou uma conjuntura política tão
surrealista. Os brasileiros que acompanham os capítulos da novela da corrupção,
agora encenada em sua versão eleitoral, são convidados diariamente a resistir à
desesperança e ao cinismo. Mas uma coisa não se pode negar aos personagens que
protagonizam as manchetes: eles já não têm o menor receio de insultar a
inteligência da plateia.
Considerando-se
os seus autocritérios, todos os envolvidos na trama são boas pessoas. E o
brasileiro fica pensando na falta que faz ao país um vilão. Um vilão de
mostruário, desses cuja maldade está na cara, sem qualquer disfarce. Um vilão
assim, inquestionável, colocaria os pés sobre a mesa e planejaria a próxima
imoralidade sem nenhuma ambiguidade. Mas não, são todas boas pessoas. Fazem
suas vilanias com as melhores intenções e na maior inocência.
Fonte:
Josias de Souza
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