No imaginário popular, comunistas são muitos dos que ameaçam e
amedrontam. É o ateu, sem Deus no coração, que quer acabar com as
igrejas e perseguir os crentes. É o usurpador que quer tomar a propriedade
alheia. É a depravada que pode seduzir o marido de outra. É o esquerdopata que
pode tirar o filho do caminho do bem. As lideranças de esquerda são, pelo
menos, suspeitas de pertencerem a essa horda. Eventualmente, muitos votam
nelas, apesar de poderem ser comunistas, por esperar que trarão benefícios.
Essa demonização dos comunistas tem origem na discriminação
que eles faziam dos religiosos, com base na ideia de Marx, de que “A religião é
o ópio do povo”. No entanto, à medida que alguns foram identificando
similaridades entre valores e objetivos comunistas e os de suas religiões,
passaram a procurar conciliar as abordagens. Entre católicos, desenvolveu-se a
Teologia da Libertação, que veio a ser compartilhada, por vezes com adaptações,
por vários evangélicos.
O próprio Papa
Francisco, embora não chegue a ser comunista, tem se alinhado a muitas pautas
progressistas. O anticomunismo permanece entre parte dos religiosos, nos
setores conservadores da Igreja Católica e das igrejas evangélicas, sobretudo
nas tenebrosas igrejas neopentecostais.
Todavia, o
termo comunista também tem um significado mais preciso e objetivo. No espectro
político, corresponde ao seguidor do marxismo-leninismo, que considera o
capitalismo um modo de produção transitório, em que as leis de desenvolvimento
das forças produtivas levarão a ser substituído pelo socialismo.
Também um modo
de produção transitório, o socialismo seria caracterizado pela socialização dos
meios de produção por uma ditadura do proletariado. Assim,
finalmente se alcançaria o comunismo, em que a abundância de bens e serviços e
com o ser humano tendo superado a conduta individualista e competitiva,
funcional dos modos de produção inferiores, prescindiria de um Estado
controlador, estabelecendo, na Terra, o “Paraíso da Classe Operária”.
Quem são os
comunistas no Brasil?
Temos alguns
partidos comunistas organizados no país, o que não seria o caso do PT, PSB ou
PSOL. O que tem alguma expressão seria o PCdoB, mesmo assim, vários de seus
membros e lideranças não devem seguir, integralmente, a doutrina
marxista-leninista tradicional. Em todo o caso, os comunistas compartilham os
valores e fundamentos dos progressistas em geral, que gravitam em torno da
redução das desigualdades de renda e oportunidades, por isso integram esse
campo político.
O termo socialista, por sua vez, é mais genérico, sem
significado tão preciso. O grupo de maior expressão atualmente, no campo
progressista, seria os sociais-democratas. Não se confundem com os comunistas
por não tratarem o capitalismo como um modo de produção transitório.
Buscam a melhor articulação entre o Estado e o mercado para manter
desigualdades de renda mínimas e oportunidades similares para todos. O PT, o
PSB e o PSOL podem ser considerados partidos social-democratas.
E o que dizer
dos liberais? Eles levantam a bandeira da liberdade, de fato o que há de mais
importante para todos, a despeito da servidão voluntária de muitos, em geral
dominados pelo medo. Em termos econômicos, o liberalismo é um movimento que
ganhou expressão na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX, em favor de maior
liberdade para os negócios e contra os privilégios de sangue mantidos pela
nobreza, algo similar aos de algumas castas do serviço público no Brasil atual.
Naquele contexto, o liberalismo tinha um papel progressista, o de lutar pela
expansão da capacidade produtiva que o mercado podia alavancar.
Entretanto,
uma vez consolidada a economia de mercado, o liberalismo econômico perde essa
função, passando a assumir outras, que nem sempre podem ser chamadas de
progressistas. O fato é que “liberal” passou a ser um termo ambíguo. Afinal,
liberdade pra quem? Difícil falar em liberdade pra todos se muitos não têm
condições dignas de vida e nem oportunidades de desenvolvimento de suas
escolhas.
A maior parte
dos que se intitulam liberais na economia, atualmente, seguem um outro
movimento, que procura se legitimar como herdeiros do liberalismo clássico
inglês, substituindo a nobreza pelo Estado. Esse movimento seria o
neoliberalismo, que ganhou expressão nos EUA, na segunda metade do Século XX,
com uma narrativa de que o livre mercado garantiria uma produção máxima,
remunerações de acordo com o que cada um contribuir para essa produção e a
intervenção do Estado apenas atrapalharia.
Contudo, mesmo
desconfiando da capacidade transformadora do Estado, os liberais com valores e
práticas igualitárias estão no campo progressista. Claro que o mercado não
equaliza oportunidades nem reduz desigualdades. Os economistas sabem disso até
pelos manuais de microeconomia. É útil que os liberais progressistas busquem
mecanismos que minimizem oportunidades de corrupção originadas da própria
atuação do Estado, ainda que não consigam prescindir desse Estado na promoção
de melhor qualidade de vida para todos.
Não tem
sentido acusar os progressistas de não se interessarem pelo crescimento
econômico. O ponto é que a taxa de crescimento do PIB é uma estatística
demasiadamente agregada, chegando não significar muito. Afinal, quem estaria se
beneficiando do crescimento? Uns poucos que já têm muito? Gerações atuais,
destruindo recursos não renováveis e as condições ambientais do futuro? Enfim,
o verdadeiro corte entre progressistas e conservadores não é entre mais e menos
Estado, mas entre manter e reduzir as desigualdades.
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