A verborragia na política da Microrregião de Coelho Neto sempre foi criativa, desde a colonização, até hoje. São causos linguísticos dos mais simples aos mais sofisticados que envolvem figuras folclóricas da sociedade. Esse terá o nome da cidade e dos personagens envolvidos subtraídos. Embora com nomes fictícios, o acontecido foi verdadeiro.
1º de janeiro, dia da posse do
novo prefeito e da nova câmara de vereadores de Nascedouro, assim chamaremos a
pequena cidade. No legislativo, alguns novos e outros reeleitos. Nessas
ocasiões, de quatro em quatro anos, o vereador com mais idade, entre os pares
presentes, responde pela presidência para dar posse ao prefeito, vice-prefeito
e colegas edis.
Pois bem, Antonino Lucena assumiu
a direção dos trabalhos com voz pastosa e o “ar” de autoridade nacional, quase
um senador da república de tão empolgado que estava diante da plateia que se
aglomerava no prédio da pequena câmara municipal, onde o calor era insuportável
e os presentes suando às bicas, às 10 horas da manhã.
Meticuloso, exigente, daquele
tipo “de tudo nos mínimos detalhes”, Antonino Lucena era a cara da ordem e
progresso. Quem o conhecia sabia com certeza que o discurso seria longo e a
posse dos eleitos demorada. Os agradecimentos aos presentes e a saudação aos
mortos durou quase meia hora.
No recinto, já com o nó da
gravata desfeito, suando por todos os poros e, bastante, impaciente se encontrava
o vereador para 1º mandato, Zequinha Quente. Zequinha sentava, levantava,
respirava fundo, passava a mão na cabeça- sem muitos cabelos, fazia menção de
sair do local e desesperava-se com a tranquilidade na oratória do condutor da
sessão.
-No passo de jabuti que o
Antonino tá falando, só vamos sair daqui lá pra uma da tarde, disse ao colega
da direita. – Aqui vai dar merda, concluiu espalmando as mãos.
Com a impaciência já no limite, o
edil decidiu tomar “uma” e retirou-se do plenário. Nessas ocasiões vendedores
ambulantes disputavam palmo a palmo os consumidores, vendendo principalmente
produtos gelados que ajudavam a amenizar o calor. De forma que, Zequinha
Quente, saiu diversas vezes do local da cerimônia para refrescar a garganta com
uma antártica gelada.
De tanto sair e entrar, entrar e
sair, Zequinha foi advertido pelo presidente, que interrompeu o discurso para
dizer: “queremos avisar aos presentes e, principalmente, às autoridades que é
proibida a ausência no local dos trabalhos”. A advertência foi indireta, pois o
nome do fujão não fora mencionado, entretanto os presentes entenderam,
incluindo o próprio, para quem era o “carão”.
Após risos- meia boca, de alguns
convidados, Zequinha Quente perdeu, de vez, a paciência e a compostura que a ocasião
exigia e disse em tom baixo, porém ouvido pela presidência e obsequiados: -
“Antonino, tú tá esticando a sessão mais que “priquito” de vaca”.
Antonino Lucena, homem de moral,
conhecido por respeitar e ser respeitado, pouco afeito a brincadeiras e dono de
um vocabulário sem palavras chulas, não se conteve. Ficou de pé, branco como quem
viu a morte, deu uma palmada na mesa, que estalou no auditório, e disse com voz
impávida e locução rápida: “senhores, vereadores Zequinhas, os senhores podereis,
seres cassados, agoras”.
Carlos Machado