Última frente de resistência à crise fiscal e à recessão, municípios de todas
as regiões do País estão à beira do caos com a redução drástica de repasses da
União, queda generalizada de receitas e aumento contínuo de despesas. “Cerca de
cem cidades não receberam 1 centavo do Fundo de Participação no mês passado,
700 sofreram a retenção de quase 80% daqueles recursos e zeraram a arrecadação,
mais de mil estão com a folha atrasada há meses, restos a pagar, fornecedores
há sete ou oito meses sem receber e devem à Previdência”, contabiliza Paulo
Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios.
Em 2015, 42,6% das 5.568 localidades não conseguiram fechar as suas
contas. Neste ano, o total “com certeza passará de 50%”. Na segunda-feira 9,
milhares de prefeitos e gestores iniciaram, em Brasília, a XIX Marcha em Defesa
dos Municípios, uma jornada de quatro dias para reivindicar soluções ao governo
e ao Congresso.
A arrecadação total aumentou 6,3% nominais em 2015 e a despesa, 9,4%.
O Fundo de Participação dos Municípios, principal fonte de receita
de 60% deles, encolheu 14%, descontada a inflação, no primeiro trimestre diante
do mesmo período do ano passado, o equivalente a 323,5 milhões de reais.
Os gastos com pessoal pesam. As prefeituras têm 6,3 milhões de
servidores, inclusive terceirizados, e a folha de pagamento somou 240 bilhões
de reais no ano passado. “As despesas com pessoal cresceram muito porque vários
estados e municípios tiveram de assumir serviços de saúde e educação e isso
exigiu o aumento daqueles gastos, difíceis de cortar”, analisa o economista
Francisco Lopreato, da Unicamp, especialista em contas públicas.
Os maiores gastos são com educação e saúde. Cerca de 24% da arrecadação
destina-se ao pagamento de 1,2 milhão de professores. O piso do magistério
aumentou 11,4% em janeiro, impacto de 8 bilhões. O aperto fiscal soma-se ao
subfinanciamento sistemático de alguns programas federais. O custo médio da
merenda é de 2,50 reais por aluno, e o do transporte escolar, 114 reais, mas o
governo repassa 30 centavos por aluno para o primeiro gasto e 12 reais para o
segundo. Os cortes reduziram a eficácia do combate, em 2015, às três epidemias de doenças transmitidas
pelo mosquito Aedes Aegypti, segundo relatos de prefeitos em Brasília.
A União deve aos municípios 43 bilhões de reais de restos a pagar de
emendas parlamentares canceladas, mas com verbas empenhadas. O resultado é a
paralisia de obras do Programa de Aceleração do Crescimento e da Fundação
Nacional de Saúde, da construção de postos de atendimento médico e ginásios em
escolas, entre outras. A interrupção implica perda de ao menos metade do
investimento por deterioração das edificações, oneração no caso de retomada e
falência das empresas privadas contratadas pelas prefeituras.
O corte de 17 bilhões de reais no orçamento do Ministério das Cidades
interrompeu os projetos do Minha Casa Minha Vida, entre outros programas. O balanço dos
prejuízos inclui a perda de 120 bilhões de reais para as administrações
municipais, provocada pela renúncia do governo federal a receitas do IPI e do
Imposto de Renda entre 2009 e 2014.
Além de enfrentar a falta crônica de dinheiro, os prefeitos podem sofrer
sanções se as contas estourarem. A Lei 10.028, de 2000, prevê punições aos
transgressores da Lei de Responsabilidade Fiscal, incluídas a suspensão de
transferências voluntárias e de projetos, multa de 30% dos vencimentos anuais e
prisão do chefe do Executivo. “Quem deixa restos a pagar de dívidas contraídas
no último ano de mandato está sujeito a detenção por 1 a 4 anos. Há centenas de
prefeitos condenados com sentença transitada em julgado e não cabe mais
recurso”, segundo Ziulkoski.
Fonte: Revista Carta Capital
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